Friday, October 14, 2016

Lamento dos tempos insanos


Eu só sei que os tempos são insanos.
Tento colocar panos quentes,
Mas, ó como me sinto doente,
Eles queimam, ardem e voltam a dizer
O que sempre soube:
Vivemos em tempos insanos,
Por mais que Levinas pregue alteridade.  
E o único rosto que consigo ver
É o do cachorro que me mordeu.
E o irmão que chega
É para me assaltar ou pedir esmola
(logo, para eu,
que somente trago
na sacola
um pão duro, uns restos
de linguiça, de sardinha
e adoraria ter um pouco de farinha).
Ainda se pudesse assistir Chaplin
Num telão
Zombando da ilusão dos tempos modernos.
Mas, não! Os tempos são insanos, insensatos!
O que nos salva é uma Zanna Gallo no teatro,
Ou Haianne Saiury cantando japonês,
Lembrar de Luiz Gonzaga ou Dominguinhos,
Vez por outra ouvir o Lito tocar um chorinho
E reviver Cartola com Nicodemos.
É tudo que nos resta, o que podemos
Ter de poesia nestes tempos insanos.
E, enquanto o inferno arde,
Molhar os panos
Para enxugar o suor
E tentar viver como se fosse normal
Viver esta vida de animal
Que não tem como se libertar das cercas
Invisíveis que nos dizem
Que não há modos de sermos felizes. 

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